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Roda da Vida: o artesanato como instrumento para preservar e expandir a tradição familiar

A história do mineiro Alex Teles começa muito antes do momento em que ele se tornou artesão. A técnica primitiva usada por ele hoje foi inventada por seu avô antes mesmo de Alex nascer. Geraldo Teles de Oliveira, conhecido por GTO, teve a primeira inspiração artística aos 52 anos, em um sonho. “Quando percebeu, estava entalhando com seu canivete de cortar fumo”, conta Alex. “Três anos depois, a primeira obra do meu avô já estava correndo o mundo.” O método passado de pai para filho e de filho para neto utiliza formões retos para o entalhe manual em uma única peça de madeira, sem interferência de ferramentas elétricas ou lixas.

Sem formação acadêmica, sem referências, sem saber ler e passando parte da vida no meio do mato, GTO foi um autodidata. Dizia ele que “veio do povo para entalhar para o povo, e que a essência e a criatividade de suas obras eram do povo”. Seu traço e técnica únicos chamaram a atenção do mundo, inclusive de estudiosos do povo inca e maia. Já sua inspiração vinha de sua conexão com as plantas, com os animais e com a vida, além dos sonhos. Possuía uma percepção profundamente espiritual em relação ao mundo e à existência, o que é visto com clareza em suas peças.

Carlos Drummond de Andrade uma vez perguntou a GTO, em uma de suas visitas à Diamantina, o porquê da escolha da madeira como base de sua arte e qual o motivo para não ter um marchand para comercializar suas obras. “Ele dizia que não era artista, era apenas instrumento de algo maior, do Divino”, recorda-se Alex. Quando criança, meu avô fez amizades com as árvores porque se sentia muito solitário e, já adulto, “só feriu as madeiras com a permissão delas”.

A história da família Teles se mistura com a trajetória do Sebrae. GTO foi o primeiro a ser convidado a representar o segmento de artesãos na instituição.

O escultor com a analista do Sebrae Minas Amanda Guimarães. Foto: divulgação. 

O Sebrae passou pelas três gerações da minha família, desde o ano em que foi fundado. Até hoje, todo o suporte de que preciso quando tenho dúvidas ou para desenvolvimento de cursos é sempre dado com muito respeito por nosso trabalho e nossa história. E não só para a família Teles, mas para todos os artesãos brasileiros de destaque que são acolhidos e fazem parte do circuito formado pelo Sebrae.

Alex Teles, artesão.

“Me sinto privilegiado por ter essa aproximação com o Sebrae. Todos da época do meu avô e do meu pai quando me encontram dizem a mesma coisa. É como se o Sebrae fizesse parte da nossa família porque nos sentimos abraçados e apoiados em nossa jornada como artesãos.”

Passado, presente e futuro

Nos últimos anos, Alex tem se dedicado a preservar e expandir a tradição artística de sua família. Desde pequeno, ele acompanhou de perto o ofício e quando decidiu seguir como artesão, aos 40 anos, contou ao pai Mário Teles que desejava criar algo que refletisse sua identidade. Foi então que herdou os formões do seu avô.

A vida de Alex sempre foi marcada pelo estudo e pela arte. Ele lembra com carinho de ter tido Adélia Prado como professora. O cinema também foi uma paixão que sempre o acompanhou, especialmente filmes de diretores renomados como Ingmar Bergman e Federico Fellini. Formado em comunicação, sociologia e filosofia, Alex manteve uma leitura constante de poesias e um interesse especial pela física, inspirado pelas ideias do físico Fritjof Capra, principal teórico do pensamento sistêmico.

Escultura “O Selo de Bergman”. Foto: divulgação.

Em suas peças, Alex traz símbolos do folclore e as manifestações artísticas que o cercam. O artesão acredita que “a obra é um diálogo constante entre o que se vê e o que se sente, incorporando elementos das suas principais referências do cinema e do imaginário criativo”. Recentemente, o artesão criou inclusive uma obra inspirada no filme “O Sétimo Selo”, de Bergman, além de uma peça que mistura o Minotauro com uma Mula sem cabeça.

Alex lembra que, diferentemente dele e do avô, as obras do pai trazem como inspiração as manifestações populares, como a folia de reis, o congado, a festa junina, além da música, herança da juventude em que tocava viola e sanfona com GTO.  Apesar das obras deles terem traços diferentes e preservarem as individualidades, a identidade da família é facilmente perceptível. Ele destaca com carinho três obras que acabam por formar uma trindade artística: a Roda da Vida, idealizada pelo avô; a Mandala, do pai; e a Roda do Tempo, de sua autoria.

De todas as premiações recebidas por sua família, Alex destaca algumas das mais recentes: ele foi um dos 24 artesãos mineiros vencedores da última edição do Prêmio Sebrae TOP 100 de Artesanato, em 2023. O reconhecimento garantiu ao artesão ter uma de suas peças entre as 10 expressões artísticas que ambientaram as reuniões do G20, no Rio de Janeiro, em julho de 2024, e participou da Bienal Internacional de São Paulo, no fim de agosto.

“Sem essa parceria com o Sebrae, a projeção do nosso trabalho poderia ter sido muito diferente. A instituição oferece suporte logístico, divulgação, além de ajudar com toda a estrutura para desenvolvimento de cursos e capacitações”, celebra Alex. “Somente graças ao apoio do Sebrae com o transporte das obras e hospedagem para a Bienal, por exemplo, conseguimos participar.”

Devido à relevância do trabalho de GTO, que continuou repercutindo nas obras do filho e do neto, é possível encontrar peças da Família Teles atualmente em mais de 190 países – como Japão, Inglaterra, Austrália e Vietnã – em exposições, casas de colecionadores e até mesmo na Casa Branca, nos EUA. Paralelamente, Alex Teles mantém também um compromisso com a arte-educação e já impactou cerca de 60 mil crianças, levando a arte às escolas. Para ele, a educação e a arte devem andar juntas, formando um alicerce para o desenvolvimento humano.

Sustentabilidade e empreendedorismo juntos

Essas e outras histórias que conciliam a preservação e o uso sustentável dos recursos naturais são abordadas na mais nova série de reportagens da Agência Sebrae de Notícias (ASN), perpassando por pautas como apicultura, café, reflorestamento, fauna, energia solar, biojoias e tecnologia, entre outras. São brasileiros e brasileiras que transformaram suas vidas por meio do empreendedorismo, atrelando responsabilidade e sustentabilidade aos seus negócios e à sociedade. Em comum, todos compreendem que o senso de comunidade é outro benefício produzido pelas respectivas atividades.

Acompanhe todas as matérias aqui.

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