As mulheres devem participar das decisões relativas ao enfrentamento das mudanças climáticas, já que são as mais afetadas pelos eventos climáticos extremos, como enchentes e secas. A defesa foi feita pelas participantes da primeira sessão de trabalho da 1ª Reunião de Mulheres Parlamentares do P20, o fórum do Legislativo do G20, que acontece em Maceió (AL).
O tema da sessão foi “Promovendo a justiça climática e o desenvolvimento sustentável para mulheres e meninas”.
Presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher da Câmara, a deputada Ana Pimentel (PT-MG) disse que o atual projeto de desenvolvimento mundial se centra na austeridade e na exploração predatória do meio ambiente produzindo adoecimento, empobrecimento, fome e mortes. Segundo ela, esses eventos, como secas e enchentes, não podem ser chamados de tragédias, já que não são acidentes, mas são frutos de escolhas humanas equivocadas e perversas.
“E, sim, as mulheres são as mais afetadas. De perdas, econômicas, migração, aumento da violência, casamento infantil, evasão escolar, perda de renda: esses são alguns problemas sociais causados pela crise do clima e que impactam as mulheres de forma desproporcional. Em todo mundo, a perspectiva é de mais de 1,2 bilhão de desalojados até 2050, sendo que 80% deles serão mulheres”, afirmou.
De acordo com a deputada, em regiões atingidas pelos desastres, como secas extremas, as mulheres assumem, além do cuidado da casa e dos filhos, a busca por alimentos e por água. Para ela, no Brasil, por ideologia, alguns setores negam as evidências científicas das mudanças climáticas. Ela ressaltou ainda o papel do extrativismo predatório das terras e dos corpos para o quadro atual, fazendo com que as terras, os territórios e as mulheres vivam sob ameaça constante, com aumento da fome e da pobreza feminina no Brasil e no mundo.
“É necessário outro projeto”, salientou. Ela criticou a política de austeridade fiscal e a defesa do superávit fiscal acima da defesa da vida. E defendeu um orçamento que garanta políticas públicas universais e a prevenção das crises ambientais. Entre as soluções estudadas para a justiça climática, ela citou a taxação de grandes fortunas, que sirva para construir medidas de proteção ao meio ambiente e construção de projetos de desenvolvimento sustentável. “Hoje os 3% mais ricos controlam 13% da riqueza mundial e são os maiores responsáveis pelos desastres e crimes ambientais”, salientou.
Ana Pimentel destacou que, na Câmara dos Deputados, diversas propostas para a proteção do meio ambiente são de autoria de mulheres. “É fundamental que as mulheres sejam centralmente colocadas na decisão dessas políticas, por que quanto mais são incluídas, mais avançamos para a construção de um desenvolvimento sustentável e justo”, disse.
Soluções globais
A senadora Leila Barros (PDT-DF), líder da bancada feminina no Senado, também chamou a atenção para os deslocamentos provocados por eventos climáticos, que superaram os provocados por guerras, repressão e violência em 2023. O Brasil figura entre os seis países com mais pessoas deslocadas por desastres naturais. Ela defendeu políticas integradas e sustentáveis, com abordagem global, para enfrentar a crise climática, devido à interdependência entre as nações e povos.
“Nós, mulheres, sabemos o peso que recai sobre as nossas costas quando se trata de cenário de dor, de morte e de perdas”, frisou. Conforme ela, a falta de políticas públicas recai desproporcionalmente sobre as mulheres, as maiores responsáveis pelos cuidados das famílias.
“Políticas de austeridade e a diminuição dos serviços públicos essenciais agravam a vulnerabilidade das mulheres, especialmente aquelas em contexto de sobrecarga social e de trabalho doméstico, como mães solo e mulheres negras e indígenas, enfrentam disparidades de renda, moradia e acesso a serviços básicos”, afirmou a senadora. Para ela, é preciso levar aos parlamentos essa visão de cuidado das pessoas e do planeta.
Políticas de longo prazo
Representante da ONU Mulheres, Ana Claudia Jaquetto Pereira afirmou que é preciso focar, além das ações emergenciais, nas políticas de longo prazo para a preparação para os eventos climáticos extremos. Segundo ela, essas políticas devem levar em conta as desigualdades de gênero. Ela observou que as desigualdade também são organizadas a partir dos elementos da raça, etnia, geografia, capacidade e idade.
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“Caso se confirmem os piores cenários climáticos, até 2030, prevê-se que mais de 236 milhões de mulheres e meninas sofrerão de insegurança alimentar, em contraste com cerca de 131 milhões de homens e meninos”, disse. “As alterações climáticas e a perda de biodiversidade têm impactos intensos nas mulheres e meninas que vivem nas regiões rurais pobres, porque elas dependem fortemente dos recursos naturais para obter alimentos, água e combustível”, completou.
“Embora as mulheres sejam guardiãs das práticas sustentáveis nos territórios, elas ainda enfrentam diversas barreiras ao defender o meio ambiente, como a exclusão dos espaços de decisão tanto nacionais como multilaterais”, acrescentou a representante da ONU Mulheres.
Representantes de outros países
A necessidade de as mulheres serem protagonistas das discussões sobre a crise climática, já que são as mais afetadas, também foi defendida por representantes de diversos países.
Representante dos Estados Unidos, a deputada Sydney Kamlager-Dove foi uma das que defendeu que mais mulheres entrem na discussão sobre as mudanças climáticas, já que há pouca participação delas hoje. Além disso, disse que a resposta política para a crise ambiental deve se centrar em grupos marginalizados, como mulheres e meninas pobres.
Representante do Reino Unido, Anelay of Saint Johns observou que a renda das mulheres cai com os eventos climáticos extremos e as crianças ficam fora da escola. Além disso, as sobreviventes dessas catástrofes também enfrentam dificuldades extras, como violência sexual, abuso e tráfico humano.
Valentina Ghia, representante da Itália, chamou a atenção para a relação entre a exploração predatória do meio ambiente e a exploração econômica das mulheres e defendeu a discussão em conjunto das questões de gênero e ambiental.
Para a representante da Índia, Kalpana Saini, as mulheres têm habilidades específicas para lidar com esses desafios ambientais.
Representante de São Tomé and Príncipe, Celmira Sacramento lembrou que a mulheres frequentemente são as guardiãs das praticas sustentáveis. Ela observou ainda que os países desenvolvidos contribuem mais para os problemas ambientais, mas os países que contribuem menos são os mais afetados pelos seus efeitos. Na visão dela, os países mais ricos devem apoiar financeiramente os países mais pobres na transição para desenvolvimento sustentável.
Para a representante da Indonésia, Vanda Sarundajang, a cooperação entre países, inclusive no campo de tecnologia, é ponto chave para a superação do problema.
Mulheres no poder
Representante da União Interparlamentar, Cynthia Lopes Castro ressaltou que apenas 11% das presidentas e primeiras ministras do mundo são mulheres. Além disso, salientou que as mulheres representam metade da população mundial, mas estão representadas em apenas cerca 26% dos Parlamentos do mundo. Segundo ela, ainda há países sem nenhuma deputada, como Iemen, por exemplo, e apenas 22% dos Parlamentos são presididos por mulheres no mundo. “As mulheres devem estar representadas, mas também participar dos processos de decisão”, reiterou.
Ela ressaltou a importância das cotas de cadeiras de mulheres para se conseguir essa representatividade, como garantido no México, onde 50% das vagas no parlamento são reservadas às mulheres e onde hoje as presidentas dos três poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário – são mulheres. Ela avalia ainda que violência, fadiga e ameaças afastam as mulheres da política.